A tentativa de compreender Deus é, para o ser humano, como o esforço de conter o oceano em um copo d’água. Desde os primórdios, cada cultura tentou nomeá-Lo, descrevê-Lo, agradá-Lo — e, principalmente, controlá-Lo. Não por malícia, mas por limitação. O homem, feito de carne, tempo e espaço, tenta entender Aquele que está além da carne, fora do tempo e acima do espaço.

Religiões moldaram Deuses com desejos, vontades e humores. Criaram rituais para acalmar Sua ira, e leis para cumprir Sua vontade — como se Ele fosse um legislador invisível, observando atentamente o comportamento dos homens, pronto a premiar ou punir. Mas essa concepção é menor do que Ele. É, na verdade, um reflexo do próprio homem projetado sobre o céu.

O Deus verdadeiro não deseja — Ele é. Ele não espera — Ele sustenta. Sua vontade não é uma escolha entre opções, mas a própria natureza da existência. Ele não exige, não precisa, não carece. Ele é o Eu Sou — absoluto, eterno, indivisível, incognoscível em essência.

Dizer que a vontade de Deus é “que as pessoas façam o bem” é como dizer que o Sol existe para iluminar o nosso quintal. É verdade, mas é uma verdade tão pequena diante da grandiosidade do que Ele realmente é, que se torna quase uma mentira por omissão.

Precisamos romper com a figura do “Deus domesticado” — aquele que se parece com líderes, pais, reis ou juízes humanos — e tentaremos vislumbrar, ainda que de forma limitada, a imensidão dAquele que não pode ser contido. Um Deus que não se ofende, não muda, não se contradiz. Um Deus que é maior que a própria ideia de grandeza. Um Deus cujo Reino não é deste mundo — não por rejeitá-lo, mas por simplesmente ultrapassá-lo em tudo.

Não é à toa que, ao se revelar a Moisés, Deus não disse “Eu desejo”, nem “Eu espero”, nem mesmo “Eu criei”. Ele disse: “Eu Sou”.

Essa declaração contém tudo e ao mesmo tempo escapa de toda tentativa de definição. “Eu Sou” não é uma resposta; é um rompimento com todas as perguntas. Deus não se apresenta como algo que começou a ser ou que virá a ser, mas como Aquele que é — desde sempre, em tudo, além de tudo. Esse “ser” não é estático, como um objeto, nem mutável, como um sentimento. É fundamento. É raiz. É existência pura.

Quando os homens falam da “vontade de Deus”, quase sempre falam de projeções humanas: querem que Deus goste do que eles gostam, odeie o que eles odeiam, se irrite com seus inimigos, abençoe seus negócios e castigue quem os despreza. Essa vontade de Deus se torna um espelho distorcido, onde os fiéis veem sua própria imagem ampliada — não a face do Criador.

Mas Deus não é homem. Não muda como o vento, nem sente como os mortais. Sua justiça não é reação, é natureza. Sua graça não é favor, é manifestação. Ele não precisa de adoração, sacrifício ou agrado — porque nada Lhe falta. Quando Ele se revela, não o faz por carência, mas por abundância. Ele transborda.

Religião, então, muitas vezes deixa de ser caminho e se torna prisão. Ao tentar “explicar” Deus, ela desenha limites que O reduzem. Cria regras, cargos, doutrinas, estruturas de poder — e, com isso, transforma o Incontido em institucionalizado. Deus se torna propriedade de denominações, e Sua palavra é sequestrada por interpretações humanas.

Mas o Reino de Deus não é um templo feito por mãos humanas. Não é comandado por pastores, padres, líderes ou gurus. Ele está dentro, está entre, está além. Seu trono não é de ouro, mas de glória invisível. Seu povo não é uma seita, mas uma comunhão de seres despertos, que já não vivem mais para agradar um “Deus com ego”, mas para manifestar um Deus que é essência.

O verdadeiro Reino de Deus não se impõe com força. Ele é semente. Cresce silencioso. Não usa o sistema deste mundo, não entra pela lógica do prazer, da dominação ou da recompensa. E por isso, aos olhos do Império das Trevas, o Reino parece fraco, inútil, até tolo. Mas é eterno.

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